O psicodiagnóstico não
é restrito apenas a uma conclusão específica, mas procura evidenciar questões
subjetivas do sujeito e a dinâmica familiar em que está inserido e que
influenciam nos sintomas apresentados pelo sujeito. Afinal, busca-se um
entendimento do que está além do conhecimento do paciente, mas que lhe causa
tanto sofrimento.
Cunha (2000) aponta que
Psicodiagnóstico é uma avaliação
psicológica, feita com propósitos clínicos e, portanto, não abrange todos os
modelos de avaliação psicológica de diferenças individuais. É um processo que visa
a identificar forças e fraquezas no funcionamento psicológico, com um foco na
existência ou não de psicopatologia. (p. 23)
Para a realização de um
psicodiagnóstico diferencial e compreensivo, em que os objetivos sejam
alcançados, levando-se em consideração aspectos biológicos e sócio-culturais do
sujeito, devem-se realizar entrevistas iniciais, anamnese, testes, hora lúdica
familiar, hora do jogo infantil; para então, a partir dos dados observados,
levantar hipóteses e confirmá-las ou não no decorrer do psicodiagnósticos. As
hipóteses confirmadas serão discutidas com os pacientes e familiares e, se
necessário, faz-se encaminhamento para outros profissionais. Cunha (2000) completa
a definição do processo psicodiagnóstico como
[...] um processo científico,
limitado no tempo, que utiliza técnicas e testes psicológicos (input), em nível individual ou não, seja
para entender problemas à luz de pressupostos teóricos, identificar e avaliar
aspectos específicos, seja para classificar o caso e prever seu curso possível,
comunicando os resultados (output),
na base dos quais são propostas soluções, se for o caso. (p. 26)
Inicialmente, o
psicólogo recebe a queixa (motivo) manifesta, mas deve buscar o motivo latente,
incluindo-o no processo e levantando hipóteses que auxiliem o paciente em
sofrimento, pois, geralmente, a queixa inicial é o sintoma daquilo que o
sujeito não tem conseguido suportar. Cunha (2000) aponta que “o plano de
avaliação é estabelecido com base nas perguntas ou hipóteses iniciais,
definindo-se não só quais os instrumentos necessários, mas como e quando
utilizá-los.” (p.26)
Arzeno (1995) define
que o psicodiagnóstico trata- se de um estudo profundo da personalidade, de
acordo com o ponto de vista clínico, isto é, há a existência de uma parte
consciente e outra inconsciente. A Psicanálise aponta com veemência que os conteúdos
reprimidos no inconsciente são sintomatizados a partir do mecanismo de defesa
neurótico, o recalque.
De modo resumido, Cunha
(2000) define alguns passos do diagnóstico psicológico clínico
a)
levantamento
de perguntas relacionadas com os motivos da consulta e definição das hipóteses
iniciais e dos objetivos do exame;
b)
planejamento,
seleção e utilização de instrumentos de exame psicológico;
c)
levantamento
quantitativo e qualitativo dos dados;
d)
integração
de dados e informações e formulação de inferências pela integração dos dados,
tendo como pontos de referência as hipóteses iniciais e os objetivos do exame;
e)
comunicação
de resultados, orientação sobre o caso e encerramento do processo. ( p. 31)
Entretanto, a partir de
uma breve explanação do processo psicodiagnóstico, faz-se necessário discutir o
primeiro contato e vínculo a ser estabelecido com o paciente, ou seja, o rapport. Basicamente, a primeira
entrevista tem o objetivo de colher as informações iniciais sobre o motivo que
levou o paciente a procura de um psicólogo.
Arzeno (1995) define
que a primeira entrevista
[...] é um conceito referente à
primeira etapa diagnóstica, que tem um objetivo específico, mas não significa
que deve ser só uma nem que deve ser realizada obrigatoriamente no início do
processo diagnóstico. Em circunstâncias especiais podemos obter dados após a
aplicação dos testes, e não no início da consulta. (p. 23)
Assim, não necessariamente
colhemos todas as informações sobre o paciente e o contexto no qual está
inserido, pois as hipóteses, os questionamentos e as possíveis conclusões
surgirão ao longo das sessões de atendimento, principalmente com o uso de
testes e hora lúdica com brinquedos para as crianças.
A duração dos
atendimentos é estipulada e, portanto, como profissionais, devemos buscar
algumas respostas iniciais, motivos, queixas, sofrimento, etc., para que
possamos iniciar o psicodiagnóstico. Não devemos esquecer-nos de considerar
fatores estressantes nas consultas e, principalmente, ao escolher os testes e aplicá-los,
buscando acalmar o paciente ou remarcar o atendimento para o dia mais próximo
com o intuito de não prolongar a distância de um atendimento interrompido.
Outro requisito
importante, além da ansiedade dos pacientes, há a ansiedade dos pais,
principalmente de crianças, que pode vir a atrapalhar a entrevista inicial,
devido a um medo excessivo de que seus erros possam ser apontados e sejam
crucificados como culpados e fracassados na criação e desenvolvimento de seus
filhos. Infelizmente, ainda há crenças errôneas sobre o profissional de
Psicologia, e, por isso, devemos acolher o paciente e seus familiares, buscando
o estabelecimento de um vínculo de confiança, sem julgamentos, para que o
psicodiagnóstico possa acontecer e que o paciente e a família possam utilizar
os recursos oferecidos pelo psicólogo, buscando amenização do sofrimento e
sintoma.
Desse modo, sugere-se
para o primeiro contato com o paciente, uma entrevista livre, não direcionada e
que possibilite a investigação de hipóteses iniciais sobre a dinâmica familiar
do sujeito e a queixa apresentada, não se esquecendo de investigar o motivo
latente que tem causado o sintoma no paciente. Arzeno (1995) complementa que
[...] serão levados em
consideração tanto elementos verbais como não verbais da entrevista, a
gesticulação dos pais, seus lapsos, suas ações, como por exemplo ir ao
banheiro, esquecer algo ao partir, segurar o tempo todo uma bolsa ou pasta, fazer
comentários sobre o consultório (agradáveis ou desagradáveis) ou sobre a nossa
pessoa como profissionais, fazer alguma queixa (mesmo parecendo justificada
pode estar encobrindo uma queixa de outra natureza), desencontro do casal ao
chegar para a primeira entrevista, trocar o horário por engano, trazer uma
lista escrita com dados excessivamente detalhados, olhar o teto o tempo todo,
pedir um conselho rapidamente, etc. (p. 30)
Outro aspecto
importante para o psicodiagnóstico é a hora lúdica em que o brincar predomina,
isto é, em atendimento com crianças, o brincar é extremamente importante e
necessário no processo, pois ao brincar, a criança projeta seus desejos e
fantasias inconscientes e evidencia aspectos da dinâmica familiar em que está
inserida.
Apesar de os adultos
serem diferentes das crianças, pois não aceitam o brincar no setting terapêutico, o processo é
semelhante em ambos os casos, porque tanto o adulto quanto a criança projetam e
nos revelam o contexto que vivem e o seu sofrimento psíquico. Arzeno (1995)
afirma que
[...] entrevista com a criança é
livre, assim como a do adulto, mas existem diferenças entre elas. O adulto
fala, geralmente sobre os seus problemas, e quando fica em silêncio consegue
tolerá-lo melhor que a criança. Esta, na melhor das hipóteses, consegue dizer
umas poucas palavras sobre o que está acontecendo. (Arzeno, 1995, p. 47)
Assim, a criança
torna-se diferente do adulto, porque esta utiliza outros meios de comunicação
que apontem aspectos importantes de sua subjetividade. O adulto só tem o meio
da fala ou associações livres, como
bem teorizado pela Psicanálise, enquanto a criança, que normalmente se
apresenta resistente, desconfiada e tímida, ao brincar, se sente livre para
“dizer o não dito”, que tem muito a revelar sobre o sintoma apresentado pela
mesma.
Arzeno (1995) aponta
que
O papel do psicólogo na hora de
jogo diagnóstica é o de um observador não participante. Mas essa não
participação tem um limite. Existem crianças que ao chegar já solicitam que
façamos alguma coisa com elas. Essa pode ser a forma que elas encontram para
manter-nos entretidos porque temem que possamos fazer-lhes algum mal, uma
sedução por motivos mais ou menos semelhantes, ou então, uma verdadeira forma
de buscar contato. (p. 51)
Então, “tudo o que vier
a acontecer na hora do jogo é significativo” (p. 54), mas não podemos
esquecer-nos de que é importante ter o cuidado ao mobilizar a angústia da
criança, pois falar sobre o sofrimento é doloroso para o paciente, podendo
inclusive, interferir no vínculo estabelecido com o mesmo.
No brincar é possível
observar como se dão as relações dos pacientes com seus irmãos, colegas, pais e
outros familiares, bem como os aspectos do desenvolvimento físico do paciente.
Porém, vale ressaltar que algumas situações podem evidenciar fantasias
inconscientes infantis, pois nem sempre o que eles nos trazem realmente
aconteceu, o que nos leva a buscar comprovações das situações trazidas pelos
pacientes.
Desse modo, podemos
concluir que o psicodiagnóstico é um processo dividido em etapas e com tempo
limitado, a fim de investigar a demanda a partir de diferentes recursos
psicológicos, baseando-se em hipóteses levantadas e fundamentadas teoricamente
como auxílio a conclusões do caso e possíveis encaminhamentos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ARZENO, M.E.G. In.: Psicodiagnóstico Clínico. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
CUNHA, J.A. Fundamentos do Psicodiagnóstico. In.: Psicodiagnóstico V. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2000. Cap. 2, pp. 19-31.
Parabéns muito bem redigido e completo o texto sobre psicodiagnóstico.
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